quarta-feira, 15 de setembro de 2010

AGRURAS E RECOMPENSA DO TRABALHO PASTORAL

"Esforça-te para saber bem como suas ovelhas estão, dê cuidadosa atenção aos seus rebanhos, pois as riquezas não duram para sempre, e nada garante que a coroa passe de uma geração a outra. Quando o feno for retirado, surgirem novos brotos e o capim das colinas for colhido, os cordeiros lhe fornecerão roupa, e os bodes lhe renderão o preço de um campo. Haverá fartura de leite de cabra para alimentar você e sua família, e para sustentar as suas servas. (Pv 27.23-27)

INTRODUÇÃO: o trabalho pastoral que empreendemos na Igreja de Jesus não é fáci. O Senhor Jesus revelou que um bom pastor é aquele que dá a vida pelas suas ovelhas". (Jo 10.11).

São diversos os textos bíblicos que nos auxiliam a entendermos as dificuldades e a importância do trabalho pastoral junto ao povo de Deus, dentre eles está Provérbios 27.23-27, onde encontramos uma palavra tremenda para os pastores dos rebanhos de Deus.

Quero destacar as atribuições que este texto dá aos pastores.

1º. Esforço para saber bem como estão as ovelhas. As ovelhas, por vezes, comportam-se como a mulher sunamita de II Reis 4.26, a quem perguntou Geazi, servo de Eliseu: “está tudo bem com você?”. A mulher que acabara de ver seu único filho morrer respondeu “está tudo bem”. O coração dela estava tomado de tristeza, indignação, desespero e outro sentimentos resultantes de um drama como aquele. É preciso muito esforço por parte do pastor para saber bem o que se passa com as ovelhas.

2º. Cuidado e atenção ao rebanho. O Senhor escolheu a ovelha para simbolizar as pessoas que compõem seu povo por conta das peculiaridades dos seres humanos. Assim como as ovelhas, as pessoas precisam de cuidados. São carentes, não podem se suprir, se curar, se conduzir por conta própria. Precisam ser pastoreadas, orientadas, ensinadas, corrigidas, motivadas, curadas. E, para dificultar ainda mais nosso trabalho pastora, há um “leão devorador” que espreita as ovelhas, esperando por seus descuidos para devorá-las (I Pe 5.8).

3º. Cuidado pastoral: garantia de multiplicação do rebanho. Observe no texto de Provérbios 27 a constatação “pois as riquezas não duram para sempre, e nada garante que a coroa passe de uma geração a outra”. É preciso haver pastoreio eficiente para garantir a sobrevivência do rebanho. Somente com os devidos cuidados pastorais é que o rebanho sobreviverá e se multiplicará noutra geração de ovelhas. Lembre-se: ovelhas enfermas e desnutridas não se multiplicam.

4º. Removendo a palha seca e provendo o melhor alimento. “Você é o que você come” – este postulado embasa os que defendem maior rigor na escolha dos alimentos que ingerimos. Uma alimentação desbalanceada reduz a qualidade e a duração de uma vida. Pois bem, as ovelhas precisam receber o melhor alimento espiritual. Há muita “palha” disponível em literaturas, DVDs, CDs, seminários, etc. Como pastores somos responsáveis por ensinar as ovelhas a desprezarem a palha e a apreciarem o “capim da colina”.

5º. O sindicato dos pastores excelentes tem sede do céu. Há uma boa vontade excepcional da parte de Deus para com os servos que se dedicam a cumprir com excelência o árduo trabalho de pastorear suas ovelhas. O texto de Provérbios 27 garante as bênçãos materiais que o bom pastor colherá. Carne, lã, leite e sustento são mencionados no texto.

CONCLUSÃO: há uma promessa de Deus para quem cuida bem das vidas do rebanho de Jesus. Esta é a melhor maneira de um servo gastar sua vida: no cuidado das ovelhas de Jesus.
Desconhecido


sexta-feira, 27 de agosto de 2010

QUANDO A VIDA VAI AO CHÃO

“...há tempo para todo o propósito ... tempo de derrubar e tempo de edificar” - (Ec 3:1,3)


Dois fatos dominaram os noticiários esta semana. As demolições das barracas de praia e da *Fonte Nova. Ambos tinham um tom triste, melancólico e saudosista. Vi atletas e torcedores dando declarações e se despedindo da velha Fonte. Também vi barraqueiros chorando ao virem suas barracas e seu ganha-pão tombarem na areia.
Embora os dois sejam demolições e os dois tenham certo ar melancólico e saudosista, há duas lições bem distintas em ambos. Derrubar quase sempre está associado à perda. Normalmente associamos derrubar a algo ruim, sofrimento e dor, mas estes episódios parecem nos mostrar como fatos semelhantes podem trazer experiências e sentimentos diversos.
A demolição das barracas de praia comprova a regra de que derrubar é ruim, sofrido e às vezes até desesperador. Era de cortar coração os depoimentos de homens e mulheres. A falta de perspectiva, a falta de esperança de que alguma coisa acontecesse para minimizar a sua dor ou resolver o problema, fez com que alguns pensassem em medidas extremas. Pessoas se amarraram a botijões de gás, intentando contra a própria vida, declarando com seu gesto de que lhes faltava esperança pra viver dali por diante e que preferiam até morrer. A demolição era ruim, sem propósito, sem esperança.
Já na demolição da Fonte Nova o sentimento maior era outro. Havia saudade, havia sofrimento, mas havia esperança. A certeza de que o sofrimento será compensado pelo futuro brilhante, pelo estádio melhor que será erguido no mesmo local, faz que a dor seja suportada até com certa alegria, como a mãe que dá a luz. Há despedida, mas ela tem o gosto de reencontro, é partida com sabor de chegada, é adeus com tom de até breve. É a demolição boa, com propósito e cheia de esperança.
Estes dois eventos são parábolas da vida. Na vida vamos experimentar demolições. Algumas podem ser demolições sem propósitos, sem razão de ser. Derrubadas que são só sofrimento e dor, resultado da irresponsabilidade de outro, onde somos apenas vítimas passivas do processo. Uma das piores tragédias da vida é a dor sem lições e dor sem razões. Mas existe outro tipo de demolição. É preciso aprender que dentre os propósitos da existência está o “derrubar”. Precisamos aprender que há horas que a única coisa a fazer é jogar ao chão, fazer cair, “perder”. Não se pode edificar algo novo quando a velha estrutura ainda está ali, de pé. É bom entender que para que as nossas tendas sejam ampliadas, as velhas tendas devem ser derrubadas. Na linguagem bíblica é tempo de derrubar, para que venha o tempo de edificar.
Quando vemos a vida ir ao chão, lamentamos. Quando experimentamos a perda, reclamamos. A grande sacada da vida não é viver sem perdas ou demolições, mas dizer com o profeta: “bom é trazer a memória aquilo que nos traz esperança”. A diferença entre ambos não está no passado, de glória, nem no presente, de dor, mas no futuro, naquilo que Deus edificará depois da demolição, no novo que Ele fará em nós e por nós.

• A demolição da Fonte Nova será hoje às 10:00h

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

LAPIDAR UMA MULHER

"Mestre, esta mulher foi surpreendida em ato de adultério. Nos foi ordenado apedrejar tais mulheres. E o senhor, que diz? " (João 8:4,5)

O mundo está estarrecido com a decisão do tribunal iraniano de condenar à morte, por apedrejamento, uma mulher, apanhada em adultério. O Brasil se ofereceu para recebê-la como refugiada. A minha cabeça gira, sentimentos se misturam, confusão.
Primeiro porque a reação do mundo tem um tom espetacular. Todos parecem estar diante de um fato inusitado, inédito. Na verdade este fato é um deja vu. Só pra falar de outro evento espetacular recente, em 2003 na Nigéria, onde a mulher teve a sentença adiada porque estava amamentando. O tribunal decidiu que ela só seria lapidada (nome dado ao ato de apedrejá-la) até à morte, depois que o filho fora desmamado. Daquela época só resta o poema de Affonso Romano Sant’Anna “Lapidar Uma Mulher”.
Segundo porque a reação de todos parece fazer acreditar que este tipo de barbárie contra a mulher já não mais existe em nossa sociedade. Porém, todos os dias os noticiários falam de homens matando mulheres pelos motivos mais vis, se é que há motivo pra se tirar a vida de alguém. Há cerca de 30 anos atrás um sujeito resolveu marcar o rosto de sua mulher com ferro em brasa com as letras MGSM (Mulher Gaieira Só Matando). Tal violência nos faz estremecer, talvez por causa do tom teatral. Mas violência contra a mulher é algo que vem de longas datas e que infelizmente está longe de terminar e acontece bem mais perto da gente do que se imagina.
No Irã, como na Nigéria e na maioria dos países de religião fundamentalista acredita-se que uma mulher pega em adultério precisa ser lapidada (apedrejada). Mas parece que este também é o sentimento de muitos que acreditam que palavras, pedras, socos, facas, tiros são instrumentos para lapidar a mulher e lavar a honra dos homens.
É interessante que uma única palavra possa ter significados tão diferentes. Lapidar pode significar apedrejar, tirar a vida, matar. Mas na minha infância lapidar significava trabalhar uma pedra preciosa, ressaltar as suas qualidades, tirar todas as imperfeições para que aquilo que é verdadeiramente precioso apareça. Na linguagem de Affonso Romano Sant’Anna:

“Há quem tente lapidar / uma mulher / como se lapida / jóia rara / e pedra bruta.
Com escalpelo / cinzel / buril / inscrevem nela uma figura, depois /
a expõem nos salões / revistas e altares / apregoando quantos camelos /
quantos colares / vale o dote / -da criatura.
Na Nigéria também / lapida-se mulher / mas de forma / inda mais dura”.

O maior protesto que se pode fazer contra esta violência cometida no Irã ou na Nigéria, a melhor forma de mostrar a estes bárbaros o quanto estão errados não é oferecer abrigo político, embora seja uma tentativa nobre, mas será que teremos território para abrigar todas as mulheres a serem lapidadas? O que faria o mundo tratar de forma diferente a mulher não é o jogo diplomático. O que fará diferença de verdade é a forma como tratamos as nossas mulheres, é a maneira como as lapidamos. É fazer como Jesus, mesmo quando estiverem erradas receberem a oportunidade de continuarem conduzindo as suas vidas rumo à uma vivencia mais plena, mais digna. É aprender com Jesus a verdadeiramente Lapidar uma mulher: “eu não te condeno, vá e não peques mais”. Vá e viva a vida abundante, e mostre o seu lado mais bonito, mostre-se como uma pessoa digna.
Portanto a minha bandeira de protesto contra a violência feminina no Irã ou em qualquer parte do mundo é que de forma prática, no dia a dia mostremos como se lapida uma mulher.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

OS VENDILHÕES MODERNOS

No mundo pós-moderno adaptar-se é a ordem. Ou se adapta ou se extingue, esta é a lei. A competitividade tem exigido cada vez mais habilidade, por isso não adianta manter-se fiel a métodos ou “visões” se estes não conseguem responder tão rapidamente quanto a concorrência. Inquietação, busca pela excelência, perfeição e tudo isso a baixo custo para conseguir concorrer no mercado globalizado.
O mundo eclesiástico também vive os seus dias de inquietação na busca da excelência nos métodos visando a “concorrência” da religiosidade globalizada, que na cultura pós-moderna virou um grande “shopping”, oferecendo ao cliente uma “espiritualidade sob medida” e a gosto do freguês. Na busca por “novos mercados” e na tentativa de vencer a concorrência têm-se reduzido os custos, inclusive dos nossos valores mais caros e hoje encontra-se no mercado religioso ofertas imbatíveis. O custo tem sido reduzido em muitos casos ao ter, ou melhor a dar o que se tem, mas sem nenhuma afetação no que se é.
Nesta busca por “novos mercados” os “executivos da fé” têm aberto mão da qualidade, o que no mercado globalizado é um erro grave. O mercado exige qualidade e baixo custo. O que se tem oferecido é a redução dos custos à custa da queda da qualidade. Ao invés da religiosidade/espiritualidade que traz esperança tem se consumido a religiosidade/espiritualidade que entorpece (ópio).
No afã de não perder o mercado e até expandi-lo e na busca por adaptar-se aos novos tempos e à lei da livre concorrência, não nos é permitido lançar mão de qualquer método. Todo novo método precisa ser avaliado à luz dos ensinos das escrituras. Sem observar esta regra básica e no afã de crescer, de virar mega a igreja tem se prostituído, perdendo, inclusive toda a sua relevância histórica. As ovelhas continuam desgarradas e errantes, mas destas (quase) ninguém tem compaixão, mas em compensação os títulos estão cada vez mais em voga e as relações humanas estão cada vez mais hierarquizadas. Há igrejas que têm se tornado tudo o que Cristo não gostaria que fôssemos: os lobos e as ovelhas, pastores e mercenários transitam nos mesmos apriscos, com os mesmos “discursos”. CONFUSÃO.
Resgatar a sua relevância histórica é um dever das fiéis, mesmo correndo o risco de estar na “contramão” da globalização religiosa. Perceber a sua missão ao ser deixada na terra e esforçar-se por cumpri-la é agradar Àquele que nos alistou. Ser movido de compaixão pelas vidas dos sem-vida, ser resposta às perguntas feitas pelos sem-voz, enfim fugir do CULTO/ESPETÁCULO que a tantos tem atraído e traído a verdadeira vocação da igreja.
Ser igreja de Jesus é ser serva, disponível e comprometida com o Projeto do Reino de Deus. É ser igreja onde a vida do Cristo é destilada nos relacionamentos com os de dentro e os de fora. Onde o amor/graça é o cimentador dos relacionamentos.
Oração: Ó Eterno, nestes últimos dias firma os nossos pés para não vacilarem diante das tentações eclesiásticas. Não nos deixe cair na tentação mercadológica de fazer das tuas ovelhas negócio.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

SAUDADE DE DEUS

Ouvi dizer da dificuldade que é expressar na língua inglesa o significado de saudade. Não é fácil, porque saudade é algo tão típico das línguas latinas e tão peculiar da nossa sentimental alma brasileira que não encontraria paralelo no pragmatismo anglo-saxão. Uma definição que particularmente gosto é a de um teólogo brasileiro, homem de Deus (ele riria se pudesse ler isso): “saudade é o bolso onde a alma guarda aquilo que provou e aprovou”.
Diz ainda Rubem Alves que saudade quanto mais se tenta explicar, na língua inglesa, mais se vai acumulando retalhos. Até parece que este sentimento só continua sendo bem expresso pela palavra saudade. Coisas da língua portuguesa.
Mas por certo cada um a quem me dirijo, ainda que não saiba definir com palavras o que significa saudade, sabe bem do que estou falando, pois também sente AQUELE NOSTALGIA de alguma pessoa ou coisa da qual está separado e que por um instante lhe é dado o direito de tê-lo em lembrança ao sentir um cheiro, um gosto ou ao ouvir uma música ou outra coisa que o desperte magicamente.
Deus também sabe o que é saudade. Ele sente saudade. Saudade de nós. Na sua alma (me perdoem os que não crêem que Deus tem uma alma) Deus guarda a vontade de nos ter ao seu lado. Deus sente saudade de nós, gostaria de nos ter de novo no seu jardim. Desde que partimos lá também ficou sem graça, sem brilho, virou lugar da saudade, das memórias tristes (o por do sol também é triste por lá) e o criador na virada de cada dia se lembra dos bons tempos, e gostaria de ter-nos novamente em casa ...
Uma das cenas mais ternas e dramáticas da bíblia, eu encontro no relato da criação. Aquele que nos fala da criação de tudo (um a um). Tudo criado, o homem e a mulher são criados por Deus para relacionar-se com Ele, viver em comunidade e exercer a administração gerencial dos recursos naturais. E tudo havia recebido de Deus um curto, mas perfeito diagnóstico de que era bom: “Viu Deus tudo quanto fizera e eis que era muito bom”... e belo (Gênesis 1:31). Mas o relato seguinte, quando se aborda o conflito de relacionamento entre a criatura e o seu Criador e onde emerge a figura da serpente aparecendo entre um e outro encontro do Criador com a criatura e esta parece estar muito longe de ouvir a sua voz e responder à sua sede de encontro.
A cena é extremamente humana e aconchegante, mesmo que o ambiente esteja carregado e o silêncio seja tão pesado. DEUS VEM VISITAR OS SEUS FILHOS, na virada do dia, hora da saudade da alma. Num primeiro momento nem presença, nem a voz de Adão e Eva são sentidas, e só surgem após alguma insistência por parte do Pai.
Gosto da expressão “virada do dia”, entardecer, sol “caindo”, a revoada de pássaros ao redor da copa das árvores, céu avermelhado. No interior era a hora da visita dos amigos ou mesmo dos filhos aos seus “velhos”, hora sagrada. Tomar cafezinho e bate papo na casa do pai. A hora da saudade da alma. É nesta hora que Deus “sai de casa” e vai à casa dos seus filhos – comer bolo de milho e tomar um gole de cafezinho na mesa da cozinha ao lado do fogão de lenha. Veio só para dizer que se importa, que nos quer, que tem saudade de nós, que gosta de estar com os homens e mulheres que criou e que gostaria de sentar numa roda pra conversar conosco.
Mas quando chega o criador dá com a cara na porta. De fato, a cena é ainda mais dramática. Quando eles desconfiam que Deus está se aproximando, fecham a “casa” e vão se esconder no matagal, lá longe. Eles não querem se encontrar com Deus. Temiam a reação por isso fogem. Reação de criança que não morre dentro de nós – fugiram. Temiam o encontro com Deus e também consigo mesmos: Não querem assumir a gravidade do que fizeram nem as suas conseqüências. Temiam pois sabiam que estar diante de Deus é como estar diante do espelho da verdade. A presença do Eterno os impeliria à reflexão, dor, choro, restauração e conseqüente transformação. Aproximar-se de Deus é arriscar-se à mudar. Eles não gostam de pensar nisso, preferem fugir: “ouvi a tua voz no jardim, e, temi, porque estava nu, e me escondi”. Começam a jogar a culpa adiante. Novamente parecem crianças balbuciando desculpas esfarrapadas ao invés de assumirem e voltarem atrás. A continuidade da conversa é catastrófica. MAS DEUS NÃO DESISTE DE NÓS. E assim o tempo e o espaço são testemunhas da voz de Deus que ecoa: “ADÃO, ONDE ESTAS?’
Ele nos busca e por vezes nos escondemos e por isso parece que Ele não vai nos encontrar. Quando chega não nos acha nem ouve a nossa voz. Fugimos. Mas Ele insiste até nos encontrar. Deus continua procurando seus filhos fujões, perdidos, quer encontrá-los para matar a saudade, a cena é tão forte na parábola do filho pródigo.
Há quem pense num Deus que busca para punir, para requerer explicações, mas na cena da parábola o mais importante é abraçar, beijar, festejar, as explicações não só não são requeridas como são ignoradas, o mais importante é beijar e receber o filho que voltou, é saber que de agora em diante a alegria voltou à casa.
Ele está com saudade, deseja o reencontro, quer festejar, não feche a porta.
Roberto Amorim

segunda-feira, 19 de julho de 2010

SAUDADE DA IGREJA


Hoje acordei saudoso. Acordei com saudade da igreja. Saudade da “aurora da minha vida” espiritual, daquele tempo que a igreja era composta de gente simples, sem tanto glamour, da igreja do órgão e do piano (as mais sofisticadas), dos hinos do velho e bom Cantor Cristão, e até das brincadeiras que os assembleianos faziam, dizendo que a única coisa que batista tinha de cristão era o cantor (uma alusão ao fato de as irmãs batistas usarem maquiagem, cortarem o cabelo e vestirem calças – todas estas atitudes tidas como não cristãs). Saudade da velha briga doutrinária sobre os dons, sobre línguas estranhas. Saudade da radicalidade da conversão e do ardor missionário. Saudade da ética protestante e dos frutos reconhecidamente evangélicos, onde até e principalmente os de fora reconheciam a lisura, a integridade, a pureza como sinônimos de irmão.
Sinto saudade dos pastores apaixonados pelo rebanho, de gente que se deu, que morreu sem estar preocupado com sua própria segurança e com o seu próprio bem-estar, contanto que o Evangelho chegasse aos confins da terra, gente cujo foco estava em ganhar os perdidos, bem diferente dos pescadores de aquário deste tempo cujas igrejas podem até inchar, mas que nenhuma diferença fazem para os que se encontram perdidos. Saudade dos obreiros incansáveis, trabalhando de sol a sol (II Tm 4:2) visando alcançar os perdidos, bem diferente dos preguiçosos que optam pelo caminho mais curto e confortável de alcançar os já alcançados. Saudade dos líderes firmes que conduziam o rebanho não ao sabor do mercado ou da última onda, mas por princípios, ainda que isso significasse antipatia. Saudade dos grandes oradores de outrora que embora tocassem em temas tão densos, conseguiam manter a audiência extasiada, saudade dos sermões sobre o céu e as delícias do porvir, bem diferente do psicologismo e da teologia de confissão positiva tão comum em nossos dias.
Sinto saudade tal qual o Senhor sentia da igreja de Éfeso (Ap 2:1-8). Saudade porque tais marcas ficam a cada dia mais raras. Saudade porque se comparo a igreja de outrora com a de hoje parecem se tratar de entidades, organizações e de organismos absolutamente diferentes.
Agora me lembrei da parábola do Rubem Alves sobre jequitibá e eucalipto. “Uma vez cortada a floresta virgem (de jequitibás), tudo muda. É bem verdade que é possível plantar eucaliptos, essa raça sem vergonha que cresce depressa, para substituir as velhas árvores seculares ... Para certos gostos, fica até mais bonito: todos enfileirados, em permanente posição de sentido, preparados para o corte. E para o lucro ... Jequitibá e Eucalipto, não é tudo árvore, madeira? No final, não dá tudo no mesmo? Não, não dá tudo no mesmo, porque cada árvore é a revelação de um habitat, cada uma delas tem cidadania num mundo específico”.
A igreja cresceu, ocupamos os lugares de honra na mesa do rei, ocupamos posições importantes na sociedade, estamos presentes em todas as esferas de poder, mas estamos perdendo o nosso lugar no Reino, o nosso castiçal está se apagando (Ap 2:5). Somos uma igreja que cresceu e chegou a números inimagináveis, somos mais de 30.000.000 de evangélicos no Brasil, mas já não vivemos em comum, já não temos uma só alma e um só coração (At 4:32; 2:44). Não somos mais a igreja periférica e pobre. Como atribuise ao diálogo entre Thomaz de Aquino e Inocêncio IV "já não podemos mais dizer 'não tenho ouro, nem prata', mas também já não podemos dizer 'levanta-te e anda”. Deus tenha misericórdia de todos nós e nos faça voltar ao primeiro amor.

Roberto Amorim